O que é um Embromance?

Mais do que a simples análise e interpretação de suas palavras, o leitor, ao ler um texto, aprecia a sua métrica e, ao meu ver, principalmente, a sua sonoridade.
Toda palavra, além de um significado, possui uma forma e fonética, que auxilia a transmitir o grau de austeridade ou informalidade do que se quer comunicar.
Partindo-se destes pressupostos, os Embromances buscam exaltar a forma e a sonoridade em suas expressões, em detrimento completo de sua lógica ou real significado.
Cabe a eles embalar o leitor em uma atmosfera superficial de eruditismo e exaltação emotiva, sem que contudo coliguem-se as informações contidas em cada real significado das frases.
Menos vale o "ser" do que o "parecer ser".
Mais vale o símbolo do que o significado.
Não há como entendê-los sem experimentá-los.
Embarquem nesta experiência e apreciem.

domingo, 28 de junho de 2009

Cavalheiro

Nunca o haviam visto por ali. Balançou seu guarda-chuvas vistoso e, com olhar entreaberto, vislumbrou seu objetivo. Era uma rigorosa manhã de outono, com as copas das árvores coalhadas de chuva. Não fosse por um certo ar de austeridade e passaria desapercebido na multidão. Mas foi caminhando, passo a passo, obstinadamente, até encontrar-se sozinho, em outro cômodo, do outro lado da sala. Dava para ouvi-lo, respirando com dificuldade e rompendo o silêncio, vez por outra, com um pigarreado incessante e estrondoso. -Não é necessário preencher seu nome- advertiu-lhe o meirinho, com um sorriso diplomático. Subiu pela escada, que conduzia ao mezzanino e bateu insistentemente na porta, aonde se lia “entre sem bater”. Retirou, sem hesitar, um maço do bolso e acendeu seu cigarro, molhado pela chuva e enrugado. Nunca ninguém jamais batera naquela porta, muito menos com tamanha indignação. E eis, por fim, que ela se abriu. E fez-se entrar o cavalheiro, sem cerimônia. Durante a maior parte do tempo o que pode-se ouvir foram, somente, seus pigarros - vigorosos e intermitentes. Talvez por isso não tenha havido maior assombro, ao o vermos sair pela porta, sem , ao menos, fechá-la. Um sopro forte de vento adentrou a sala, como um sutil presságio de que algo de grave estava por acontecer. Com as mãos umedecidas e crispadas de fumo, cruzou como um raio o arco que conduzia ao jardim de inverno. No topo de sua cabeça, uma aresta de sol reluzia, platinada, na testa franzida, com os traços marcados, de frio e de dor. Notei-lhe tristeza, nos olhos cansados e os cabelos grisalhos, que o tempo não omitia. Ao fitar-lhe, virava-me os olhos e, de tanto esquivar-se, tombou sobre um vaso. O barulho, estridente, ecoou pela sala, despertando os presentes de um leve torpor. Em um gesto áspero, ergueu-se estupefato, tentando esconder seu orgulho ferido. E, estando, porfim, prontamente refeito, aproximando-se de uma senhora, desferiu-lhe um golpe, que a fez projetar-se. – Basta de escárnio!- bradou, esbravejante, sem contudo demonstrar remorso ou hesitação. Um ruidoso pigarro, sonoro e vibrante, pois fim ao rompante e devolveu-nos a calma. Ergueu-se a senhora e, não fosse o inchaço, por nada se diria ter sido esmurrada. – É sempre bom, de manhã, um exercício - e voltou, sem ressalvas ao mesmo lugar. –Ainda aqui? – arguiu-lhe o meirinho, e ,num rápido ensejo, cuspiu-lhe na face. Era o gesto pior que o de outrora e causava-lhe asco, maior que sua dor. Não haviam pessoas na fila, mas, mesmo sem forças, pôde se levantar. E ninguém duvidou que o faria, visto que o ódio em seu rosto aos poucos se estampava. O relógio enfim soou, anunciando o fim da jornada de trabalho. E, em meio aos passos,de corpos esfuziantes, um gesto desafinado calou a sinfonia. Com a arma em punho, ao esmo atirando, nos corpos tombando uma voz se escutava – Eu sou de um tempo em que havia respeito!- e, sem medo ou pudor, a senhora mirava. No mármore vermelho, tristes sombras repousavam. Cidadãos de um tempo em que velhas não atiravam.

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